Angélica Lopes começou sua jornada literária pensando no público adolescente: “Na infância, muitas vezes, a escolha do livro é feita pelos pais ou pela escola. E quando esse leitor chega à adolescência, o poder passa para suas mãos. A decisão passa a ser individual e pode ser, inclusive, a de não ser mais um leitor! Essa possibilidade sempre me angustiou. A de perder um leitor em potencial na adolescência.” Depois vieram os livros infantis e o volume para adultos. A escritora, que é também roteirista e redatora de TV, conta hoje com oito livros juvenis lançados e um no prelo, quatro infantis (e mais um a ser lançado em breve) e um adulto. Quer conhecer a autora por trás da obra? Então leia a entrevista a seguir.
São oito livros juvenis e três infantis, além de um adulto recém-publicado e um infantil, lançados em 2013. O que difere no processo criativo de um livro infantil, um juvenil e um adulto?
Angélica Lopes: Comecei escrevendo para o público adolescente, pois sempre me interessei pelo processo de transição. O que faz um leitor infantil se tornar um leitor adulto? Na infância, muitas vezes, a escolha do livro é feita pelos pais ou pela escola. E quando esse leitor chega à adolescência, o poder passa para suas mãos. A decisão passa a ser individual e pode ser, inclusive, a de não ser mais um leitor! Essa possibilidade sempre me angustiou. A de perder um leitor em potencial na adolescência.
No ensino médio, o currículo das escolas precisa apresentar os movimentos literários brasileiros e muitos jovens acabam se afastando do hábito da leitura por sentirem distanciamento e preconceito em relação às temáticas e ao estilo de época.
Quando me tornei escritora, tinha esse objetivo bem forte em mente: o de aproximar esses jovens da leitura, oferecer literatura contemporânea e que refletisse o seu dia-a-dia. Meus livros para essa faixa etária (Plano B: Missão Namoro, Micos de Micaela, Ficadas e Ficantes e outros) retratam o universo adolescente urbano atual: escola, shopping, shows, paqueras e festas.
Essa opção não significa que os tornei superficiais ou de consumo fácil, mas sim que utilizei os códigos que costumam atrair esse público para fisgá-lo. É quase uma isca. Com ótimas intenções, claro.
A literatura infantil surgiu quando passei a ter uma criança em casa. A convivência com minha filha, o contar e inventar histórias todas as noites para ela, fez meu olhar se abrir para essa outra faixa etária, onde tudo é possível. Daí, nasceram meus infantis: Sr Avesso, A Coitadinha, Coração de Bicho e Dicionário de Criancês.
Conte um pouco sobre os seus livros mais recentes: Essas mulheres são umas gatas e Dicionário de Criancês.
Angélica Lopes: Dicionário de Criancês é um livro de observação. Desde que minha filha começou a falar, percebi que ela recriava as palavras que não compreendia direito. Um exemplo: “brisavó”. A criança ouve “bisa”, mas não sabe o que significa a princípio esse radical. Então, a criança desconfia que talvez tenha ouvido “brisa”, essa sim, uma palavra conhecida e, dentro dessa lógica, cria uma terceira palavra, que faz mais sentido para ela.
Assim como “brisavó”, o livros tem exemplos de A a Z. “Arco-inimigo”, o arco que atira em si mesmo, “cotonerd”, o cotonete inteligente, “Torre Waffle” e outros.
O outro livro que lancei em 2013, Essas Mulheres São Umas Gatas, foi minha primeira experiência com o público adulto. Não é ficção. É um livro de humor, entretenimento, com muitas informações, estilo almanaque. Foi um desafio que a editora Tinta Negra me propôs: o de comparar o comportamento feminino aos das gatas. A tese do livro é que nós, mulheres, somos um pouco felinas: lindas, territoriais e misteriosas.
Seu infantil Sr. Avesso vai virar peça. Você participou da adaptação? Quais são as principais mudanças que são necessárias para transpor um texto literário para os palcos?
Angélica Lopes: Esse já é o meu segundo livro adaptado para o teatro, pois também montei Plano B – Missao Namoro, em 2011. Fiz as duas adaptações, claro, pois sou muito ciumenta. Quando se transpõe a literatura para os palcos, o autor tem que deixar o livro um pouco de lado. Desapegar. Utilizar o conceito, os personagens, e depois, inventar uma nova dinâmica, pois são linguagens muito diferentes. Sr. Avesso é um livro curto. Para adaptá-lo, precisei injetar mais ação, criar novos conflitos, fazer crescer os personagens. É uma história sobre tolerância, sobre entender o ponto de vista do outro. Espero montar no ano que vem.
Você trabalha também como roteirista e redatora de televisão e cinema. Nesses dois casos a criação costuma ser coletiva, enquanto a criação literária tende a ser solitária. Quais são as vantagens e desvantagens de cada caso?
Angélica Lopes: O ofício de escritor é muito solitário. Por isso, sempre que posso trabalhar em parceria (e o processo da TV e do cinema permitem isso) sou a primeira a levantar a mão.
Ganha-se muito na troca com o parceiro ou com a equipe de autores. São várias mentes tentando achar a melhor maneira de contar uma história. Ficaria louca se passasse todos os dias trancada em casa, na frente ao meu computador.
Muitos autores dizem que é preciso ter uma rotina de trabalho, muito mais transpiração do que inspiração. Você tem um processo criativo organizado, com horários e metas, ou sua produção segue um fluxo mais caótico, seguindo a inspiração?
Angélica Lopes: A inspiração é apenas uma faísca. A ideia original. A cozinheira que acorda pensando: “E se eu colocasse canela no bolo de laranja hoje?”. Ou o arquiteto: “E se essa escada tivesse um corrimão de ferro?” Isso acontece em qualquer profissão, todos nós estamos cheios de ideias na cabeça. Mas o bolo, o livro, a escada só viram realidade a partir da sua execução. É preciso trabalhar. No meu caso, sentar e escrever. Minha ferramenta é a palavra.
Claro que nem todas as faíscas você consegue transformar em fogo. Muitas ficam só anotadas, aguardando o momento em que você poderá trabalhá-las melhor.
E quanto mais você escreve, mais faíscas surgem e aí sim, você entra num fluxo criativo. Para quem olha de fora, pode parecer aquele famoso “baixou a inspiração”, mas na verdade é suor.
Você já sofreu do bloqueio de escritor enquanto estava escrevendo algum livro? Se sim, onde buscou estímulos para superá-lo? Se não, você acredita que o bloqueio é um mito?
Angélica Lopes: Bloqueio criativo, não. Mas, às vezes, uma ideia pode não render tanto ou morrer dentro de você. Não é exatamente um bloqueio, mas um perder o fôlego. Quando estava grávida, comecei a estruturar um romance adulto sobre o tema. Eu já estava com mais de cem páginas escritas, quando minha filha nasceu e a história simplesmente morreu dentro em mim. Foi uma pena, pois já tinha avançado bastante, mas falava de um momento muito específico da minha vida, que já havia passado.
Como se dá o início de um novo livro? Por onde você começa?
Angélica Lopes: Nos meus livros juvenis, começo pelo tema: bullying (74 Dias Para o Fim, a ser lançado em 2014, pela Editora Lê), anorexia (Vida de Modelo), depressão (Manoo Tattoo).
Nos infantis, parto de uma ideia que me cause encantamento. Mas já percebi minha fixação em falar de inversão de ponto de vista. Sr. Avesso é um homem que faz tudo ao contrário. A Coitadinha acha que o mundo está contra ela. Em Coração de Bicho, os animais falam de suas relações com os humanos. O Dicionário mostra a linguagem das crianças. O mesmo acontece em Nos Olhos de Quem Vê, a ser lançado em 2014, pela Escrita Fina. E comum, todos os meus títulos infantis trazem esse conceito. De que existem diversas formas de olhar o mundo.
Que dicas você daria a alguém que quer escrever livros para crianças e jovens? O que ter mente quando se escreve para esses públicos?
Angélica Lopes: As crianças tem a mente sem vícios e outra percepção de mundo. Colocar-se no lugar da criança, sem abandonar o adulto que você é, é o melhor exercício para quem quer escrever para esse público.
Você costuma realizar visitas a escolas para conversar sobre seus livros. Qual a importância desse contato para quem escreve para crianças?
Angélica Lopes: Leitores jovens não têm vergonha de chegar até o escritor, cheios de perguntas, comentários e curiosidade. Quando visito as escolas, ou participo de feiras literárias, gosto de falar sobre meus livros, sobre literatura em geral, e também mostrar aos alunos que existe um mercado de trabalho para quem gosta de escrever.
É possível encontrar influências de outros escritores em seus textos? Que nomes você considera referência para criação de histórias e para a escrita literária?
Angélica Lopes: O início do Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato, é uma grande referência. É um exemplo maravilhoso dessa mudança de ponto de vista da qual eu estava falando. Na primeira aparição da personagem, temos o besouro Mestre Cascudo e o Príncipe Escamado sobre o nariz da menina, discutindo se aquele solo estranho seria de rapadura, mármore ou requeijão. O diálogo é genial. Uma forma criativa, instigante e engraçada de se começar a contar uma história.
Na literatura juvenil, sigo estrutura de romance clássico, com narrador em terceira pessoa e capítulos com ganchos finais que geram expectativa para o que está por vir. Minhas referências são as escritoras inglesas vitorianas, como Jane Austen e George Elliot, que, com muito humor, falavam de jovens às voltas com seus primeiros amores.
Bibliografia de Angélica Lopes
Juvenis:
Plano B – Missão Namoro (Ed. Rocco)
Fotos Secretas – Missão Viagem (Ed. Rocco)
Conspiração Astral – Missão Amizade (Ed. Rocco)
Vida de Modelo (Ed. Rocco)
Micos de Micaela (Ed. Rocco)
Ficadas e Ficantes (Ed. Rocco)
Senhora, Bruxa (Ed. Leya)
ManooTattoo (Ed. Lê)
Em breve: 74 Dias Para o Fim (Ed. Lê)
Infantis:
Sr. Avesso (Ed. Rocco)
A Coitadinha (Ed. Escrita Fina)
Coração de Bicho (Ed. Escrita Fina)
Dicionário de Criancês (Ed. Escrita Fina)
Em breve: Nos Olhos de Quem Vê (Ed. Escrita Fina)
Adulto:
Essas Mulheres São Umas Gatas (Ed. Tinta Negra)
Quem quiser continuar acompanhando a jornada literária de Angélica Lopes, pode acessar o site ou o blog da escritora.
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