A arte de contar histórias está no coração do escritor. O fascínio pelos contos ouvidos na infância transforma-se em ofício, mas nunca perde o encanto. E muito disso se deve aos contadores de histórias, esses seres capazes de usar as palavras com tal maestria que personagens, cenários e mundos imaginários ganham vida bem ali, na nossa frente. Em tempos tecnológicos, a Zit Editora presta uma homenagem e também estimula a história narrada lançando a Coleção Contadores de Histórias, com textos criados por autores que são também contadores de histórias.
Com o objetivo de estimular as crianças a soltarem a criatividade, os três livros da coleção trazem uma sobrecapa que transforma-se em um palco, de onde os personagens da obra são recortados para criar a encenação. Os livros são: A rã e o boi, texto e ilustrações de Augusto Pessôa, O lambe-lambe Malaquias, texto de Lenice Gomes e ilustrações de Anielizabeth, e O príncipe Livrepássaro e o reino dos botões, texto e ilustrações de Marco Andrade. Augusto Pessôa e Marco Andrade estarão lançando seus livros nos próximos dias, no Rio de Janeiro (confira as informações no final do post), e deram uma entrevista para o blog na qual falam sobre literatura infantil, contadores de história e processo criativo.
Com a palavra, os contadores de histórias
1. Como você vê a atual produção literária para crianças?
Augusto Pessôa: Com muita alegria! A produção está cada vez mais caprichada. Um cuidado especial com texto, imagem e edição. É muito bacana ver o respeito que as editoras estão tendo com os leitores.
Marco Andrade: Eu tenho percebido que a literatura infantil, dentro do cenário atual, apresenta uma gama enorme de diferentes linguagens, gêneros textuais e códigos que entrelaçados buscam chamar a atenção dos pequenos leitores para o livro. Leitura, no meu entendimento, sempre foi sedução. Embora alguns resultados editoriais sejam esteticamente muito bacanas e de alta qualidade, correm o risco de negligenciarem o texto deixando-o em segundo plano. Penso que um livro bem elaborado e de alta qualidade é aquele onde ilustração e texto andam de mãos dadas, ambos contribuindo para que a imaginação do leitor possa fluir e as crianças possam criar, não só junto com o autor, ao ler o seu livro, mas irem muito além do que foi contado.
2. Em que o contador de histórias e o escritor se assemelham e em que se diferenciam?
Augusto Pessôa: Acho que a semelhança passa pelo cuidado com a palavra. A palavra que traz a imagem. Que faz o leitor ou ouvinte viajar! O interessante é que esse mesmo cuidado é que traz a diferença: o texto escrito é diferente do texto dito. Muitas vezes o texto escrito não cabe na boca do contador. Não se adapta à oralidade. E vice-versa.
Marco Andrade: Sou contador de histórias há bem mais tempo que escritor e penso que a grande diferença está na interpretação que o contador de histórias dá para a história contada pelo autor. A palavra escrita sugere tantas possibilidades de interpretação que o próprio autor não tem domínio sobre ela depois de lançada no mundo. O contador de histórias tem a responsabilidade não só de encantar o ouvinte com sua maneira de contar, como deve respeitar e amar a história contada. Só acredito em contadores que amam o que contam. Esses são os meus favoritos! A semelhança é o amor pela palavra, seja ela escrita ou falada, e a vontade de conquistar o outro. Escrever ou contar uma história é uma declaração de amor ao outro através da palavra.
3. Na hora de criar um novo livro você já pensa em como aquela história será contada ou isso não é levado em conta na hora da criação?
Augusto Pessôa: Não penso nisso. Aliás, muitas das histórias que publiquei não estão no meu repertório de contador. Não é uma obrigação.
Marco Andrade: Eu penso em contar a história (rs). No entanto, ela vem para mim, como um lampejo, um sopro. É uma euforia e um susto misturados! Naquele momento, não penso em alguém contando aquela história, penso no que ela poderá vir a ser dentro do outro. É a voz interna do leitor que lhe conta a história pela primeira vez, quando se corre os olhos pelo texto. As palavras vão se revelando e nos tocando ou não. A história é que vai se contando.
4. Como você vê a contação de história dentro de uma realidade atual repleta de estímulos tecnológicos difíceis de serem ignorados? Como tem sido a resposta das crianças de hoje em dia?
Augusto Pessôa: A tecnologia, a internet, as redes sociais são um fato e ponto. Mas não vejo problema na convivência dessa tecnologia com o ato de contar histórias. As crianças (e adultos) ainda se encantam com uma história bem contada. E acredito que sempre vão se encantar. Pelo menos a experiência que eu tenho é essa. Mas a história precisa ser contada com verdade. Se isso não acontecer, eles voltam para suas “telinhas”. Acho que o maior problema é que a oralidade não é apresentada aos pequenos. Isso não é só com o ato de contar histórias. As brincadeiras e os brinquedos populares também estão sendo esquecidos. Mas esquecidos de serem apresentados aos pequenos por pais e educadores. Quando essas atividades são apresentadas e incentivadas as crianças participam com gosto.
Marco Andrade: Eu sempre pensei que todos somos contadores de histórias, mas contar histórias é para poucos. É como pertencer à outra época, ser um guardador de segredos e mistérios. Contar histórias é uma arte e, como todas as artes, ela não perde o seu valor. Os estímulos estão ai o tempo todo, mas gosto de utilizar poucos acessórios (a não ser quando há uma proposta a ser seguida). Dou muito valor á palavra e acredito na força que ela tem sobre o humano. As crianças de hoje em dia continuam sendo crianças como todas as outras, os estímulos é que mudaram. Então, o segredo talvez esteja em falar para o ouvinte, buscando o que ele tem de mais natural, mais pessoal, íntimo e sagrado. E isso nunca mudou. Contar uma história é buscar tocar o outro. Se o contador acredita, o ouvinte também vive e vê.
5. Como foi a criação do seu livro para a Coleção Contadores de Histórias?
Augusto Pessôa: Conto a história A RÃ E O BOI há pelo menos 15 anos. Adoro a reação que ela ainda causa nos ouvintes! Tem muito frescor. Quando fui convidado para participar da coleção pensei nela imediatamente. Logo em seguida veio a ideia de criar as ilustrações com recorte de papel que dá um ar mais artesanal ao trabalho. Acho que a junção dessas ideias deu uma boa liga.
Marco Andrade: Minha história foi escrita há 13 anos, numa homenagem que fiz à escritora Anna Cláudia Ramos, quando ela esteve em minha cidade natal, Cataguases, em Minas Gerais. Era um encontro do Proler de Cataguases com escritores de vários lugares. Foi uma alegria quando ela me disse: “Menino, ainda vou fazer essa sua história virar um livro!”. E depois de tantas histórias e tantos caminhos, enfim, a promessa, meio profecia, se cumpriu e o livro nasceu. Tive também a alegria de poder ilustrar o meu próprio livro e isso me possibilitou colocar em prática todo o aprendizado e vivencia que tenho com cenários e figurinos. Literalmente todo o meu universo está nesse livro.
6. Conte um pouco como é o seu processo criativo: você planeja a narrativa ou deixa a escrita fluir sem saber onde vai dar?
Augusto Pessôa: Planejo. Planejo tudo. Principalmente quando estou criando e não adaptando uma história. Penso na história inteira: início, meio e fim. Mas esse planejamento não é engessado. Muitas vezes, a criação é danada e ganha vida própria indo para onde quer. Isso também acontece com a adaptação de narrativas. Apesar de respeitar a essência da história, a adaptação segue seu caminho criando imagens próprias. E acho que esse é o grande trabalho do escritor: deixar fluir a criação tentando moldar seu percurso sem interromper seu curso.
Marco Andrade: Eu sou mineiro e, como todo mineiro criado no interior, ouvi muitas histórias contadas pelos pais, tios e, principalmente, avós. Escrevo desde que me dei por gente e apesar de ser escritor há muitos anos, esse é o meu primeiro livro. Isso é motivo de muita alegria e orgulho. Todas as minhas histórias aparecem de maneiras completamente inusitadas e até engraçadas. Ora um sonho, ora um cheiro, um lugar ou um nome, tudo em mim se torna história! Eu vivo com cadernos, papeis, lápis e caneta à postos porque tudo me parece muito fascinante. A vida é uma celebração e registrar fatos e histórias, fictícios ou não, me alenta, adoça e fortalece. Minhas histórias são partes fundamentais de quem eu sou e de quem eu ainda virei a ser. Só sei viver assim, contando e escrevendo.
Lançamentos:
A rã e o boi
Dia: 24 de agosto
Às 16 horas
Livraria da Travessa – Botafogo (Rua Voluntários da Pátria, nº 97)
O príncipe Livrepássaro e o reino dos botões
Dia: 31 de agosto
Às 16 horas
Livraria da Travessa – Shopping Leblon (Av. Afrânio de Mello Franco, 290 – loja 205 – A – 2º piso)
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