Em literatura há uma máxima que diz “Mostre, não conte”, em inglês “Show, don’t tell”. Mas o que isso significa? Essa máxima traduz uma técnica literária muito utilizada por grandes escritores mas que, às vezes, acaba passando despercebida por outros tantos. O objetivo dssa técnica é tornar o texto mais dinâmico e provocar um envolvimento maior com o leitor. Se você quer conhecer mais sobre essa técnica, leia o texto até o final e descubra como aplicá-la à sua narrativa.
“Mostre, não conte” consiste em fazer com que a história “aconteça” em frente ao olhar do leitor em vez de dizer que algo aconteceu. Mostre a cena, deixe que o leitor seja testemunha do que aconteceu, em vez ficar sabendo das coisas através do autor – que seria o conte. Parece confuso? Apenas imagine a diferença entre você testemunhar uma briga de rua e alguém lhe contar que houve uma briga rua. E qual a diferença? A diferença está em que quando você mostra a cena o leitor tem a oportunidade de ele mesmo tirar suas conclusões sobre o fato (é a leitura dele, não a do autor), além de fazê-lo se sentir dentro da história. O ganho disso é que o leitor vibra mais, torce mais, se emociona mais quando sente-se parte do que está acontecendo.
No caso da briga de rua, por exemplo. Ao “contar” a cena para o leitor, você estará fazendo-o ter contato com a história a partir do seu olhar: “Ana saiu intempestivamente do carro, gritando desnecessariamente e chamando a atenção de todos no local. Pedro, muito nervoso, não sabia o que fazer e resolver sair correndo para fugir daquela situação, sem saber o que havia feito de errado.” Agora leia a mesma cena escrita de outra forma:
– Quem você pensa que é, garoto metido a besta? – Enquanto saía do carro batendo a porta, Ana gesticulava sem parar e pisava firme com seus sapatos de salto alto.
– O que aconteceu? Do que você está falando – gaguejou Pedro, tentando argumentar. Mas quando viu que a moça em roupa executiva não estava lhe dando ouvidos, desandou a correr, tropeçando aqui e ali nos desníveis do calçamento.
Percebem a diferença. No primeiro caso o texto já dá tudo mastigado para o leitor, visto que a cena traz imbutida a opinião do autor. No segundo caso, o autor apresenta a cena ao leitor e ele faz a própria interpretação. Um dos motivos é que, no primeiro caso, há a presença marcante de adjetivos: intempestivamente, desnecessariamente, muito nervoso…É uma cena subjetiva. No segundo caso há a descrição da cena, algo mais objetivo.
É preciso “esconder” o narrador de vez em quando, deixá-lo invisível, como se não existisse e o leitor estivesse presenciando a história ao vivo. Por exemplo, em vez de dizer que alguém é tímido, descreva-o como alguém que mantém sempre o olhar baixo, quando precisa falar em público fica nervoso e gagueja de leve, tentando sempre passar despercebido. Com isso, o próprio leitor chegará à conclusão que o personagem é tímido. A diferença é que você tira o leitor de uma posição passiva e o coloca ativamente dentro da história.
Outra coisa que ajuda a cena a ficar subjetiva é a falta de diálogos, e isso é decorrência de “contar” mais do que “mostrar”. Quando você cria cenas é preciso haver diálogo entre os personagens. Isso movimenta a história, dá uma certa dinâmica, além de ser um ótimo recurso para caracterizar os personagens. No diálogo sabemos como cada personagem se expressa, como fala, se usa gíria, se é tímido, se é desbocado…
Com a técnica do “Mostre, não conte”, não diga, por exemplo, que um lugar é bonito. Descreva o lugar e deixe o leitor chegar à conclusão se ele acha bonito ou não. Talvez ele não ache, e essa é a beleza da literatura. Nem sempre o que o autor escreve é o que o leitor irá interpretar. Pois cada leitura é uma leitura diferente, de acordo com as experiências de cada um. Quando você diz o lugar é bonito não deixa margem cada um fazer sua própria leitura. O leitor pode até acreditar que é bonito, mas só porque você falou, não porque ele acha aquele tipo de lugar bonito. As lacunas são importantes para se criar a própria história.
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