SEM SPOILERS
Um corpo na biblioteca é um dos livros mais famosos de Agatha Christie, a escritora britânica que só perde em vendagem de livros para a Bíblia e para seu conterrâneo Shakespeare. Mas o que este livro, o 34º romance policial de Agatha, publicado originalmente em fevereiro de 1942, tem de tão especial para ser considerado por muitos como o melhor da autora? Vamos descobrir neste post – apesar de que tentar escolher “o melhor livro de Agatha Christie” seja uma tarefa inglória.
A história de Um corpo na biblioteca
São sete horas da manhã quando a Sra. Bantry é acordada pela empregada, histérica: “Ai, senhora, ai, senhora, tem um corpo na biblioteca”. Assim começa a história, que traz a adorável Miss Marple usando sua perspicácia e conhecimento da alma humana para atuar em paralelo com a investigação oficial. Quando um segundo assassinato acontece, quem irá fazer suas deduções e descobrir a ligação entre os dois crimes se não a detetive amadora mais famosa de St. Mary Mead?
Ao longo deste romance policial acompanhamos, de um lado, as investigações feitas pelo superintendente Harper, o inspetor Slack, Coronel Melchett e o comissário aposentado da Scotland Yard Henry Clithering; de outro, as deduções de Miss Marple baseadas nas comparações que faz entre as pessoas envolvidas e os moradores de St. Mary Mead, que conhece muito bem.
Enquanto vamos acompanhando o desenrolar do caso a partir do ponto de vista dos investigadores oficiais, Miss Marple age nos bastidos, passando até mesmo um bom momento sem aparecer em cena. No entanto, se engana quem pensa que ela está em desvantagem. Pelo contrário: enquanto os investigadores se detêm nos procedimentos protocolares, Miss Marple usa todo o seu conhecimento dos hábitos e costumes humanos para chegar a conclusões à primeira vista improváveis. Afinal, é muito mais fácil que as pessoas se sintam mais à vontade para falar com uma simpática e curiosa senhorinha do que com oficiais da Justiça:
Modus Operandi de Agatha Christie
Como em outros livros da autora, nenhum personagem está livre de suspeita em Um corpo na biblioteca. Miss Marple não idealiza a natureza humana, enxergando os desvios e falhas de cada pessoa e colocando-a sob seu escrutínio. Seguindo à risca a base dos crimes nos romances policias – motivo, meios e oportunidade – a simpática detetive vai desvendando motivos ocultos, meios disponíveis e a oportunidade de levar a cabo o crime – ou melhor, os crimes.
Aqui também Agatha Christie age com o decantado fair play necessário aos autores de romance policial: ela deixa as pistas bem à vista, mas nos coloca no caminho errado. Ninguém pode dizer que as pistas não estavam ali desde o começo, mas a nossa atenção foi desviada para algo que, mais tarde, se mostrará sem importância.
Similarmente, Agatha Christie também brinca com as nossas tentativas de chegar ao culpado antes dos investigadores e da própria Miss Marple. E faz isso plantando pistas falsas, os famosos red herrings, na língua inglesa. Pistas nas quais acreditamos por também serem seguidas por outros investigadores. E quem disse que eles também não erram? Ao final, acabamos não nos sentindo tão ludibriados visto que até mesmo os responsáveis oficiais pela investigação são pegos desprevenidos pela solução apresentada por Miss Marple.
Outro artifício utilizado por Agatha Christie também nesse Um corpo na biblioteca é a forma como prevê reações estereotipadas por parte de seus leitores. É fácil presumir a inocência de certos tipos de pessoas: uma criança travessa, um médico atencioso, um policial diligente, um juiz justo… Junte-se a isso a forma como joga com nossas simpatias para nos afastar da solução correta. Uma pessoa em situação que desperte compaixão normalmente estará fora de nossas suspeitas.
E, mais uma vez, Agatha Christie surpreende com um plot twist que nos faz falar em voz alta: “Como não pensei nisso?” Mesmo sabendo que o óbvio na maioria das vezes está bem à nossa frente, a capacidade da autora de moldar a nossa percepção da realidade narrativa faz com que acreditemos na versão que ela quer que pareça a verdadeira. É como um jogo de espelhos em que nunca conseguimos saber ao certo qual a imagem verdadeira.
Se você quer entender melhor o método de Agatha Christie para criar best-sellers, leia o post sobre o Código Agatha Christie.
Agatha Christie como personagem
A autora aproveita para inserir, aqui e ali, algumas menções bem-humoradas sobre o seu ofício de escritora. Por exemplo, quando é indagada sobre a sua profissão:
– A senhora… hum… escreve histórias de detetive?
Ela sabia que as pessoas mais improváveis faziam tal coisa, e Miss Marple, com suas roupas antiquadas, de solteirona, parecia uma pessoa particularmente improvável.
– Ah, não. Não sou esperta o suficiente para isso.
– Ela é maravilhosa – interrompeu Mrs. Bantry, impaciente…
E também quando cita a si própria entre outros autores de romances policiais na voz do pequeno Peter, de 9 anos:
Vocês gostam de histórias de detetive? Eu gosto. Eu leio todas, e tenho autógrafos da Dorothy Sayer e da Agatha Christie e do Dickson Carr e do H.C. Bailey.
Se Um corpo na biblioteca é ou não o melhor livro de Agatha Christie, não importa. Certamente é um dos que merecem um lugar de destaque na sua biblioteca, seja você um leitor ávido da autora ou um leitor iniciante na obra da Rainha do Crime. E isso não é pouca coisa diante da quantidade de histórias incríveis com que Agatha Christie nos presenteou.
Agatha Christie
Um corpo na biblioteca
Agatha Christie
Editora Harper Collins
Rio de Janeiro, 2020
192 páginas
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